É preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre. Parece que Samuel Rosa seguiu os conselhos do ídolo Milton Nascimento. Afinal, não foi uma decisão nada fácil para Samuel se despedir do Skank, uma banda tão bem-sucedida por três décadas – portanto, um lugar confortável, seguro – e seguir na carreira solo.
No entanto, era uma ação necessária. Começar tudo novo de novo, mas, agora, com o bônus de carregar consigo os louros de uma obra celebrada e um estilo de compor, cantar e tocar que virou uma grife, uma assinatura personalizada, daquelas que você usa como referência quando quer falar de uma música pop tão boa em letra e música que parece uma composição de Samuel Rosa. Aí a régua é alta.
E é essa marca tão reverenciada que dá o tom ao seu aguardado disco solo de estreia, “Rosa”. A arte da capa do álbum, de autoria Stephan Doitschinoff, traz em sua tipografia diversas referências às músicas que estão no repertório. O título do disco é autorreferencial mesmo, como uma autoafirmação. A ideia é dar justamente continuidade ao legado e não criar uma ruptura, para demarcar esse rito de passagem. “Eu não queria agora buscar compulsivamente fazer algo que eu nunca fiz. Quero exercer o que eu sou”, afirma Samuel Rosa. “Minha marca é meu patrimônio.”
Samuel usa como uma espécie de mantra uma imagem que viu de perto: a de Paul McCartney tocando resignadamente “Hey Jude” ao piano, no show que ele apresentou no ano passado, para uma plateia pequena em Brasília, na qual o guitarrista, compositor e cantor mineiro estava presente. “Hey Jude” é um sucesso antigo, de 1968, mas que o ex-Beatle segue mantendo em suas apresentações. “Eu brinco que o Paul mandou por telepatia para mim: ‘Samuel, não inventa, faça o que você sabe fazer’. E o músico fez o que ele sabe fazer. “Eu quis soar eu mesmo, naturalmente, sem querer fazer um disco pretensioso. Deixei que o novo aparecesse de forma espontânea”, explica.
Ouvir as dez faixas do álbum “Rosa” é constatar como a composição de Samuel Rosa moldou o estilo do Skank como o conhecemos nesses anos todos, flertando com vários gêneros musicais, mas tendo o pop como um filtro, uma bússola.
“Rosa” foi feito de forma imersiva, intensa e orgânica, com menos máquina e mais banda tocando, inclusive quando a bateria eletrônica entra em algumas faixas. É também um disco mais brasileiro. Isso se deve muito a uma forte atmosfera musical que remete a Erasmo Carlos e Jorge Ben Jor, influências de Samuel, e a elementos bossanovistas. Tudo embalado no seu universo popular repleto de nuances.
Já as letras, que trazem vivências do próprio compositor, enveredam-se pelo universo do amor, para falar sobre relações em suas várias vertentes. É uma obra ensolarada, mesmo tratando de temas mais espinhosos dos relacionamentos.
Com exceção da faixa “Rio Dentro do Mar”, que foi composta por Samuel no final da pandemia, em 2022, essa safra de canções inéditas feitas especialmente para ‘Rosa’ nasceu de um processo peculiar desenvolvido por ele. Entre janeiro e fevereiro deste ano, o músico se isolava no quarto da sua filha, em Belo Horizonte. Ali ele fazia o que chama de ‘composição induzida’, durante três, quatro horas, sempre no período da manhã.
Depois do almoço, ele partia para o estúdio, onde encontrava os integrantes de sua nova banda, formada por Doca Rolim (violão e guitarra), Alexandre Mourão (contrabaixo), Pedro Kremer (teclados) e Marcelo Dai (bateria e percussão). “Era disciplina mesmo, eu me comprometi a chegar todos os dias com uma música nova de tarde e mostrar para banda, ainda que fosse ruim, boa, média, sem julgamentos”, conta ele.
A dinâmica era a mesma em qualquer banda: Samuel apresentava aos músicos o que ele havia composto e os demais davam suas sugestões e ponderações, como ‘coprodutores’. A diferença é que agora a palavra final foi dele. Nesses momentos, o compositor vivia uma dicotomia: ao mesmo tempo que almejava essa liberdade de decisão, ele sentia o peso de ter a última palavra. Ou como ele mesmo brinca, olhava para os lados e via que era o último da fila, que não tinha ninguém depois dele para opinar.
Mas a sinergia e a troca com sua nova banda funcionaram bem. Samuel Rosa está feliz com essa formação, que mescla músicos novos e mais velhos, e com a ideia de ir para a estrada com ela, levando a nova turnê, a partir do segundo semestre deste ano. Doca e Alexandre são antigos companheiros de música: o guitarrista o acompanhava no Skank e o contrabaixista estava com Samuel na primeira banda de sua vida. Já Pedro Kremer é conhecido tecladista da banda gaúcha Cachorro Grande e Marcelo Dai, talentoso baterista de uma nova geração, apresentado a Samuel por seu filho Juliano. O álbum conta ainda com Daniel Guedes na percussão das faixas ‘Flores da Rua’, ‘Me Dê Você’ e ‘Bela Amiga’.
Samuel divide a produção de “Rosa” com outro velho parceiro, o engenheiro de áudio e produtor musical Renato Cipriano.
(Adriana Del Ré)
Durante coletiva de imprensa virtual o artista falou sobre o álbum solo, referências, nova fase e expectativas, acompanhe:
"Em 2019 eu comuniquei a minha vontade de criar uma nova frente na minha carreira, achava que ciclo do Skank estava cumprido, muito bem cumprido, foram 3 décadas, que era hora de seguir um caminho novo (...), a perspectiva é que eu possa dar um 'fim' à essas canções , ou pelo menos parte delas, que eu consegui dar um 'destino' semelhante ao que consegui, em que algumas vezes, tive sucesso ao longo desses 30 anos de carreira (...), por esse trabalho na estrada, divulgar esse trabalho, e que isso é uma das maiores realizações que eu tenho (...),para que eu cantar com as pessoas (...).".
"Me deu vontade de ter mais as 'rédeas nas mãos', de ser dono das minhas próprias escolhas, responder por elas, erros e acertos (...). Tem um pouco mais 'de mim' no disco, (...) eu quero me 'exercer' (...), e tem sido muito divertido, eu compus mais (...)." .
"Eu quis muito falar dessa parte mais humana, de amor (...), eu quis que o disco tivesse essa cara (...).". Onde ele comenta a ilustração do álbum que também apresenta referências da natureza de Minas Gerais.
"Eu queria falar de questões cotidianas (...), na estética musical é um disco mais brasileiro (...), feito aos moldes bem 'raiz' (...), tem uma pegada reggae em alguns momentos , (...) acho que é um disco bem ensolarado (...)."
"Eu quero uma música que emocione as pessoas, que eu me emocione ao fazer (...)." .